A 3 anos do final da vigência do Plano Nacional de Educação, 45% das suas metas estão em retrocesso e seu descumprimento chega a 86%; saiba mais sobre a importância de manter o PNE no horizonte
Por Stephanie Kim Abe
O 8º Balanço anual do Plano Nacional de Educação (PNE – Lei 13.005/2014), divulgado na segunda-feira (dia 19/06) pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, comprova aquilo que já há muito especialistas e organizações vêm observando: o descumprimento do PNE e o total descaso com essa importante lei e política pública.
Segundo o documento, apenas 5 dos 38 dispositivos em andamento que servem como parâmetro para as metas avançam em ritmo suficiente para serem cumpridos até 2024, final da vigência do PNE – o que representa uma taxa de descumprimento de cerca de 86%.
Mais do que isso, 45% das metas estão atualmente em retrocesso. É o caso, por exemplo, da meta 2, de universalização do ensino fundamental para toda a população de 6 a 14 anos de idade.
O número de crianças nessa faixa etária que não frequentam nem concluíram a etapa pulou de 540 mil em 2020 para 1,072 milhão em 2021 – quase o dobro. Desse 1,072 milhão de crianças, 262 mil sequer frequentavam a escola, e outras 810 mil estavam escolarizadas, mas em etapas anteriores ao ensino fundamental.
Dados sobre a meta 2, que institui a universalização do ensino fundamental de 9 anos para toda a população de 6 a 14 anos e a garantia de que pelo menos 95% dos alunos concluam essa etapa na idade recomendada, até o último ano de vigência do PNE. (Fonte: 8º Balanço anual do PNE)
Apesar de reconhecer que há o impacto da pandemia nesses números, Anna Helena Altenfelder, presidente do Conselho de Administração do Cenpec, ressalta que ela não é justificativa para o retorno aos patamares dos anos 90:
Foto: acervo pessoal
Mais do que a situação de pandemia, esse retrocesso é resultado de medidas e estratégias que não foram tomadas pelo governo federal para evitar a evasão dos alunos. O balanço é um retrato do que aconteceu na educação do nosso país nos útlimos quatro anos – que foi o abandono total do projeto de educação que tínhamos estabelecido com o PNE, fruto de toda uma articulação entre diferentes setores e mobilização popular, em direção a uma educação mais democrática, inclusiva e de combate às desigualdades.”
Também encontram-se em situação de retrocesso as metas 3 (universalização do ensino médio), 6 (expansão da educação integral), 10 (oferta de EJA integrada à educação profissional), 11 (expansão da educação profissional técnica), 12 (expansão da educação superior), 14 (expansão das matrículas na pós-graduação), 19 (gestão democrática) e 20 (financiamento da educação).
Em contrapartida, o governo federal tem priorizado outras pautas que são alheias às necessidades e desejos da população brasileira nesse momento. “São pautas totalmente estranhas ao PNE, como a educação domiciliar e as escolas cívico-militares, que representam retrocessos ou contemplam uma minoria, ou as duas coisas ao mesmo tempo”, lamenta Anna Helena.
O estudo da Campanha Nacional pelo Direito à Educação alerta para outra questão agravante no monitoramento do cumprimento do PNE: a falta de dados abertos disponibilizados pelo governo.
Das 20 metas do PNE, 8 não possuem dados abertos suficientes para serem completamente avaliadas. Em alguns casos, a avaliação só foi possível por meio de dados acessados viaLei de Acesso à Informação, enquanto em outros não houve resposta.
É o caso da Meta 1, sobre universalizar a educação infantil na pré-escola para as crianças de 4 a 5 anos de idade até 2016, e ampliar a oferta de educação infantil em creches de forma a atender, no mínimo, 50% das crianças de até 3 anos até 2024. De acordo com o estudo, sem a divulgação da edição 2020 da PNAD Contínua – Educação, realizada pelo IBGE, não é possível monitorar o cumprimento dessa meta em relação à edição anterior do balanço.
No caso da meta 4, sobre educação inclusiva, a impossibilidade de calcular o percentual de estudantes de 4 a 17 anos com deficiência que frequentam classes comuns se deve pela restrição no detalhamento dos microdados publicados pelo Inep no início de 2022.
A falta de dados é uma questão muito grave e preocupante. Sem dados suficientes, os instrumentos e subsídios para a formulação de políticas públicas ficam comprometidos. No caso do Inep, vemos as consequências do desmonte que o órgão vem sofrendo, sendo que o seu papel é justamente produzir dados atualizados para balizar as políticas públicas”, explica Anna Helena.
Para Anna Helena, mesmo as metas mais ousadas à época da aprovação do PNE – como a meta 20, de financiamento da educação -, devem continuar sendo parâmetros para se pensar as políticas públicas daqui pra frente.
Ela relembra que “a questão do financiamento foi um grande embate de forças durante todo o processo de elaboração e aprovação do PNE. Sabíamos que tínhamos metas que eram ousadas, por assim dizer, mas isso não quer dizer que elas não eram válidas, importantes, necessárias ou impossíveis de se cumprir”.
A Campanha Nacional pelo Direito à Educação alerta para a política de austeridade fiscal que vem sendo praticada desde o governo Temer, com a aprovação da EC 95/2016 do Teto de Gastos, e que compromete os recursos para a educação. “Como é possível perceber, a situação é preocupante e o cumprimento do PNE não vai avançar sem os investimentos adequados”, diz o documento.
Anna Helena reforça:
O fato de o Plano não estar sendo cumprido não significa que as suas metas não dialogam com os desafios e as necessidades do nosso país. Obviamente, à luz da pandemia, algumas estratégias podem ser revistas. Mas o PNE se mantém extremamente válido, tanto do ponto de vista do seu fundamento – endereçado para uma educação inclusiva, que promove a equidade, uma sociedade mais justa e solidária, de princípios republicanos e democráticos – quanto dos desafios que a educação brasileira enfrenta atualmente.”
Anna Helena Altenfelder
Em tempos de eleição, a presidente do conselho de administração do Cenpec ainda faz um apelo:
“Que todos os eleitores olhem para as plataformas dos candidatos e vejam o quanto elas dialogam, em termos de educação, com as metas do PNE. É nosso dever como cidadãos olhar e cobrar dos futuros governantes, deputados e senadores que incorporem esse norte em seus programas de governo.”
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