Jogo da Vida Real: brincando e aprendendo sobre o direito à cidade

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Jogo da Vida Real: brincando e aprendendo sobre o direito à cidade

Jogo de tabuleiro gratuito trabalha o direito à cidade e explica como ele está relacionado a outros direitos humanos, como educação, moradia, transporte e lazer; saiba como acessá-lo

Por Stephanie Kim Abe

Já imaginou como seria a vida real se ela fosse um jogo de tabuleiro? Para você avançar, joga os dados e vai conquistando seus objetivos e resolvendo os problemas diários. Como em todo jogo, você pode contar com a sorte no meio do percurso: 

  • Você conseguiu o seu primeiro emprego, e ele é CLT! Avance duas casas.
  • Dá pra andar com segurança na rua à noite. Ufa! Avance uma casa.

Mas também pode ser que você seja mais azarado, e se depare com algum revés:

  • Não tem vaga na creche para o seu filho. Fique uma rodada sem jogar.
  • O ônibus atrasou e você não chegou a tempo para a prova. Volte duas casas.

Pois esse Jogo da Vida Real existe, e está disponível para download gratuito no estilo “imprima você mesmo”. O objetivo final, neste jogo criado pelo Fórum Nacional de Reforma Urbana, é conquistar cinco direitos humanos relacionados ao direito à cidade: moradia digna, saneamento básico, educação de qualidade, transporte público eficiente e cultura e lazer.

Imagem: Reprodução do Jogo da Vida Real

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O que é o direito à cidade?

O Fórum Nacional de Reforma Urbana é uma articulação nacional de várias entidades acadêmicas, ONGs, movimentos populares, entidades sindicais que se uniram numa coalizão de forças em defesa do direito à cidade. Essa coalizão de forças teve origem no movimento pela reforma urbana na década de 60. 

Karla Moroso, diretora do CDES Direitos Humanos e integrante da coordenação do Fórum Nacional de Reforma Urbana, explica que o jogo vem no sentido de ajudar a trazer mais materialidade à luta pela reforma urbana e a questão dos direitos que estão relacionados a ela:

Foto: acervo pessoal

Falar de direitos é muito abstrato, ainda mais direito à cidade. Com o jogo, nós conseguimos mostrar como essa pauta tem centralidade. Nós acreditamos que a moradia é a porta de entrada para todos os direitos – dentre eles, a educação. Porque, por mais que uma criança frequente a escola, se ela mora em um lugar com vários riscos, ou num domicílio muito adensado, sem infraestrutura adequada, ela não vai ter o aprendizado e o desenvolvimento que se espera. Nesse sentido, também a saúde é prejudicada, o trabalho, a mobilidade. Por isso o jogo traz e toca em todas essas questões“.

Direito à cidade na Constituição

Dois artigos da Constituição Federal de 1988 embasam a atuação do Fórum Nacional pela Reforma Urbana e a sua luta pelo direito à cidade: os artigos 182 e 183.

“Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.

(…)

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.”      

(Cap. II, Da Política Urbana, Constituição de 1988)

O resultado de uma política urbana que não leva em consideração a função social da propriedade privada e não olha para uma construção coletiva da cidade são serviços e espaços públicos desiguais e que pouco atendem à maioria da população.

É o que vemos hoje nas cidades: espaços completamente desiguais, espaços de gestão democrática esvaziados, pessoas muito cansadas para demandar moradia digna ou infraestrutura básica porque não estão sendo escutadas“, diz Karla.

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Aprender jogando para participar e mudar

O Jogo da Vida Real é uma proposta lúdica para trabalhar todas essas questões com as crianças e os adolescentes, já que é indicado para pessoas a partir de 12 anos. 

A luta pela reforma urbana é antiga, então o acúmulo de aprendizado sobre essa pauta está com as gerações antigas. Por isso, é importante trazer para as novas gerações esse histórico de luta por essa outra lógica, porque elas já nasceram no período democrático. Além disso, para que possam participar nas decisões que envolvem o desenvolvimento da cidade e que atinge a todos e todas, é preciso ter conteúdo e formação para fazer essas disputas nesses espaços democráticos. A cidade é um campo de disputa, porque vários interesses estão ali postos”, explica.

Karla Moroso, diretora do CDES Direitos Humanos e integrante da coordenação do Fórum Nacional de Reforma Urbana

A própria forma como o Jogo da Vida Real foi criado mostra esse posicionamento do Fórum contra o princípio mercadológico que rege o desenvolvimento das cidades hoje. 

O jogo é parecido com o famoso jogo de tabuleiro Banco Imobiliário, em que as(os) jogadoras(es) devem acumular propriedades e capital. Mas, no Jogo da Vida Real, busca-se questionar essa lógica capitalista e inverter o olhar:

Banco Imobiliário é um jogo todo voltado para o fomento da propriedade privada, para o acúmulo de capital, com base no princípio da meritocracia e do mercado. Pensamos que seria legal ter um jogo que fosse o inverso, que trabalhasse numa perspectiva da busca por direitos básicos de todos e todas, e na lógica do compartilhar“, diz. 

Karla Moroso, integrante da coordenação do Fórum Nacional de Reforma Urbana

O Jogo da Vida Real pode ser impresso em folha A4 e jogado por 2 a 4 pessoas por vez, com duração de cerca de 40 minutos. 


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