PVE Itinerante: formação e cultura afro-brasileira na Bahia

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PVE Itinerante: formação e cultura afro-brasileira na Bahia

Trabalho do PVE Itinerante é focado no que prevê a Lei 10.639/2003, que introduziu o ensino da história e cultura afro-brasileiras no currículo obrigatório

Educadores de escolas públicas de Ensino Fundamental situadas em comunidades quilombolas estão participando do programa Parceria pela Valorização da Educação (PVE), em sua versão itinerante.

Reconhecido por seu trabalho voltado à melhoria da educação pública, o programa idealizado pelo Instituto Votorantim atua nos municípios onde há operações do Grupo. O PVE atua em três frentes: qualificação das práticas de gestão educacional (equipes técnicas das secretarias de Educação); qualificação de gestores de unidades escolares; e mobilização social, envolvendo lideranças e a comunidade em si. A consultoria técnica é do CENPEC Educação, entre outros parceiros.

Por meio do PVE Itinerante ou Quilombola, como é mais conhecido, as frentes vêm sendo exploradas nos municípios de Cachoeira e Maragogipe, na Bahia, regiões atravessadas pelo rio Paraguaçu, onde está instalada a Usina Hidrelétrica de Pedra do Cavalo, administrada pela Votorantim Energia.

Por que uma versão itinerante do PVE?

Fu Kei Lin, analista sênior do Instituto Votorantim, esclarece que o Grupo Votorantim tem por princípio “atuar e evoluir em sinergia com a comunidade e as empresas”.

Ele relata que, no caso de Cachoeira e Maragogipe, havia uma demanda dos territórios quilombolas e tradicionais para que o PVE estivesse também presente localmente e atuasse na promoção da educação junto a escolas fora da zona central dessas cidades.

De acordo com o analista, o objetivo do trabalho é levar a metodologia do PVE para as áreas quilombolas a partir do trabalho com o grupo de Gestores Escolares (GESC) e a comunidade local, a fim de:

  • Contribuir com aumento da compreensão entre os participantes sobre a Lei 10.639/2003 e seu desdobramento prático, presente nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, por meio do aporte de conteúdos nos encontros formativos;
  • Construir um ambiente favorável nas comunidades escolares para a implementação de ações relacionadas a esse marco legal, por meio de estratégias de escuta e de uma estrutura mediadora, para buscar convergências e transformar inquietações em propostas de intervenção que considerem o contexto local;
  • Mobilizar e qualificar competências de gestão educacional e escolar visando à elaboração de um plano participativo para implementação de ações à luz das Diretrizes.
Fu Kei Lin, do Instituto Votorantim

Promover o desenvolvimento local a partir das necessidades do território é um ponto chave para as ações sociais das empresas em aliança com o Instituto Votorantim.”

Fu Kei Lin

História e cultura afro-brasileiras

A Lei 10.639/2003 estabelece a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileira dentro das disciplinas que já fazem parte das grades curriculares dos ensinos Fundamental e Médio.

No entanto, embora aprovada há mais de 10 anos, a legislação até hoje não é posta em prática como deveria nas escolas públicas. “Percebemos que as equipes técnicas das secretarias ainda estão buscando soluções para a implementação da Lei, e a parceria com o PVE é uma oportunidade para aprimorar esse processo”, comenta Guillermina Garcia, coordenadora do PVE no CENPEC Educação.

Atividade durante reunião da PVE Itinerante ou Quilombola. Foto: Reprodução.
Atividade durante reunião do PVE Itinerante ou Quilombola. Foto: Reprodução.

Nas escolas dos dois municípios baianos, em geral, a questão racial costuma ser trabalhada por meio de festividades, comidas típicas, artesanato, música e outros aspectos, mas de forma isolada do currículo.

Maria Guillermina Garcia.

Considerando esse contexto, é de suma importância promover reflexões junto aos professores e gestores quilombolas sobre a aplicação da Lei 10.639/2003.”

Guillermina Garcia

Disseminação de conteúdos

“O PVE Quilombola é uma estratégia para que possamos fazer incidência das práticas pedagógicas junto às escolas de Cachoeira e Maragogipe, com ações regidas pelo que orienta a Lei 10.639/2003”, esclarece Emanuelle Silva, mestre em Gestão de Políticas Públicas e Segurança Social pela Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e que, por meio do CENPEC Educação, desenvolve a iniciativa nessas regiões.

Silva conta que, com apoio e participação das lideranças das comunidades quilombolas, educadores têm refletido sobre possíveis formas de levar para as escolas o aprendizado proposto na Lei.

Emanuelle Silva

Na maioria das histórias que são contadas e mesmo nos livros didáticos e nas práticas pedagógicas utilizadas, o negro ainda é colocado numa posição de inferioridade e menos importância, por exemplo, citado como ‘escravo’, sem que seja apresentado para os alunos o contexto do processo econômico e político da época da escravidão no Brasil.”

Emanuelle Silva

Segundo Emanuelle Silva, o PVE Itinerante tem desenvolvido a prática do que chama de pesquisa-ação: “Ao mesmo tempo que estamos fazendo pesquisa formativa e trocando conceitos e aprendizagem no campo da educação antirracista e das relações raciais, temos feito um diagnóstico para entender em qual estágio está a aplicação da lei nos dois municípios, para podermos melhor explorá-la”.

A formadora acrescenta que o PVE Itinerante possibilita uma soma de experiências. “Levo para os educadores aspectos mais científicos e acadêmicos que, inclusive, remetem à construção de políticas públicas na educação no que se refere à relação com a questão racial – e tudo isso é confrontado com as práticas que já realizam no ambiente escolar, seja por iniciativa deles, seja por iniciativa da própria comunidade quilombola local”.

Contribuição do PVE Itinerante

A proposta pedagógica do PVE Itinerante parte do reconhecimento de que o fenômeno educativo ocorre dentro e fora do espaço escolar e deve articular os conhecimentos presentes na escola com os saberes construídos no território.

“Para promover o desenvolvimento das aprendizagens em sintonia com a realidade local, buscamos valorizar  aspectos como cultura, identidade e memória dos sujeitos. Por isso, acreditamos que é preciso escutar, sempre e de muitas maneiras. Escutar as compreensões, as dúvidas, os conflitos”, diz Juliana Gonçalves, técnica de projetos do CENPEC Educação.

“Em nossas formações, entendemos que as experiências prévias dos participantes são insumos para problematizar e interpretar o que já existe ou o que está faltando, para então imaginar novos caminhos possíveis. No PVE Itinerante, esse será o ponto de partida para a elaboração dos planos participativos, junto ao público participante”, esclarece Gonçalves.

As contribuições da formação são ressaltadas por Liliane Enseada, líder da comunidade quilombola situada em Maragogipe. “É importante discutirmos essa questão racial, principalmente nas nossas escolas, para que as crianças entendam a importância que o negro tem e teve e valorizem nossa tradição”, comenta.

Emanuelle Silva e educadores em comunidades quilombolas na Bahia, no contexto da PVE Itinerante. Foto: Reprodução.
Emanuelle Silva (vestido listrado) e educadores em comunidade quilombola na Bahia, no contexto do PVE Itinerante.
Foto: Reprodução.

Lucimary Ferreira da Paixão, que já foi professora na escola quilombola do município e hoje é diretora da unidade, ressalta que o PVE forneceu aos docentes algo que faltava: metodologia.

Antes do projeto, já fazíamos algumas ações e atividades, mas sem o embasamento teórico e pedagógico que o PVE veio nos dar. Agora, começamos a entender a melhor maneira de trabalhar a questão racial e de contar qual o papel do negro na história de nosso País.”

Lucimary Ferreira da Paixão

Paixão também destaca como ganhos da participação no PVE Itinerante “a valorização da identidade de cada aluno, bem como da cultura e o empoderamento de estudantes, pais, professores, outros funcionários das escolas, enfim, todos os envolvidos nesse processo de aprendizado nas comunidades quilombolas”.

Mais sobre o PVE e o Instituto Votorantim

O Instituto Votorantim foi criado em 2002 e é o núcleo de inteligência social das empresas Votorantim. Trabalha com a geração de valor compartilhado, o que significa promover benefícios sociais cada vez mais significativos e duradouros nas localidades de atuação do grupo, gerando um ambiente propício para a operação sustentável dos negócios.