Projeto Vozes Urbanas discute gênero, raça e desigualdades socioeducacionais
Primeiro debate de 2019 abordou o tema "Educação para igualdade: panoramas e desafios" para um público de mais de 70 pessoas em SP.
Por João Marinho
Aconteceu nesta quarta-feira (24/04), às 15h, no Centro de Pesquisa e Formação do Serviço Social do Comércio (Sesc), em São Paulo (SP), o primeiro debate da edição 2019 do projeto Vozes Urbanas, realizado pela Fundação Tide Setubal.
Iniciado no ano passado, o Vozes Urbanas traz uma série de debates sobre desigualdades para influir na esfera pública, ao provocar reflexão e ação de agentes da sociedade civil e do próprio setor público.
Público presente no debate “Educação para igualdade: panoramas e desafios”. Foto: José I DiCampana Foto Coletivo.
Desigualdades socioeducacionais
Diferentemente do ano passado, quando os debates abordaram uma série de temas, neste ano, o Vozes Urbanas se concentra nas questões relacionadas a gênero e raça.
“O Vozes Urbanas surge para colocar em pauta a temática das desigualdades socioespaciais porque contribuir para enfrentá-las é missão da Fundação e atuar para diminuir as desigualdades educacionais é um de seus objetivos estratégicos. Em 2018, realizamos vários módulos com diferentes temáticas, mas, para este ano, consideramos abordar em profundidade gênero e raça, importantes no momento político e contexto em que vivemos”, explica Viviane Soranso dos Santos, analista de ação macropolítica da Fundação Tide Setubal e responsável pela organização dos eventos.
O primeiro debate teve como tema “Educação para igualdade: panoramas e desafios” e contou com as presenças de mais de 70 pessoas. Renato Janine Ribeiro, ex-ministro da Educação; a antropóloga Heloisa Buarque de Almeida; e a educadora social Bel Santos Mayer foram os debatedores. A mediação foi de Iracema Santos do Nascimento, professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP).
Não há um modelo único e definitivo para abordar as desigualdades e as diversidades no contexto de radicalização que vivemos hoje, mas sabemos que a única possibilidade é o diálogo respeitoso. Somente o diálogo pode aproximar e fazer com que reconheçamos a humanidade do outro. Nisso, a escola tem um papel fundamental, além de contribuir para que as pessoas sejam mais reflexivas e menos reativas.”
Iracema Nascimento
Raça, gênero e vulnerabilidades
Depois da abertura realizada pela equipe da Fundação Tide Setubal, Iracema Nascimento iniciou uma apresentação em que introduziu o tema do debate a partir da exclusão escolar e da distorção idade-série, que chega a 27% no Ensino Médio.
Falando sobre exclusão escolar, a especialista pontuou que mais de 2,8 milhões de crianças e adolescentes entre quatro e 17 anos de idade estão fora da escola e que a exclusão está diretamente relacionada à pobreza: 53% desse contingente vem de famílias com renda de até meio salário mínimo por mês.
Outros recortes de desigualdades trazidos pela pesquisadora dizem respeito às vulnerabilidades de pretos e pardos – que somam 66,7% dos desempregados do País e 70% das vítimas de homicídio – e das mulheres, que são vítimas de violência sobretudo dentro de casa e ostentam a estatística de 12 vítimas de assassinato por dia, em média, no Brasil.
Diferenças e desigualdades entre homens e mulheres
“Ao corpo, é atribuída a desigualdade. A desigualdade é histórica: não é biológica”, diz Heloisa Buarque de Almeida no primeiro debate do Vozes Urbanas. Foto: Priscila Reis.
O gênero foi também o enfoque de Heloisa Buarque de Almeida, para quem é importante abordar o tema na escola. “Gênero é uma convenção social que parece ser natureza (…). Todo o nosso cotidiano é aprendido, e a biologia humana determina muito pouco. Ser mulher e ser homem nos diferentes contextos sociais e históricos varia muito de um lugar para o outro”, comentou a antropóloga, após destacar a pesquisa Sexo e temperamento em três sociedades primitivas, da norte-americana Margaret Mead.
Em seu estudo publicado na década de 1930, Mead descobriu três povos em que os papéis sociais que, no mundo ocidental, atribuímos como naturais a homens e mulheres eram diferentes: entre os Arapesh, homens e mulheres eram afetuosos em relação às crianças; entre os Mundugumor, ambos eram agressivos; e, entre os Tchambuli, mulheres é que eram agressivas, e os homens, afetuosos. “O gênero é uma forma de classificação social, e nem toda cultura estabelece uma grande diferença entre homens e mulheres”, concluiu Almeida.
Igualdade na diversidade
Da esq. para a dir., Iracema Nascimento, Bel Mayer e Renato Janine Ribeiro. Foto: José I DiCampana Foto Coletivo.
Bel Santos Mayer, por sua vez, destacou a questão étnico-racial. Para ela, “falar de igualdade dentro da educação é também escutar o que as pessoas estão dizendo”.
Mayer destacou a permanência das periferias das grandes cidades no Brasil, com forte presença de negros, e como existe um recorte racial e de gênero nas bibliografias dos currículos escolares, que privilegiam autores homens e brancos: “Em nosso lugar como educadores, precisamos pensar como selecionamos nossa bibliografia, as imagens que colocamos nos nossos materiais e que reproduzimos. É preciso pensar na responsabilidade de ampliar a oportunidade para todos”.
A necessidade de representação e de respeito às diferenças também se fizeram presentes na participação de Renato Janine Ribeiro, que abordou o conceito de liberdade como ponto de partida e de igualdade como ponto de chegada – a primeira, típica do liberalismo; e a segunda, de teorias socialistas. Além disso, segundo Janine, a igualdade não pressupõe desconsiderar as diferenças: “Igualdade e identidade não são a mesma coisa (…). Quando pensamos em igualdade, temos de pensar em diversidade”.
O debate foi encerrado com dois ciclos de perguntas feitas pela plateia, que trataram de questões relacionadas ao feminismo, experiências que questionam os papéis de gênero na Suécia e o papel das juventudes no contexto político atual. Ao longo de 2019, haverá ainda outros seis encontros.
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