Benevides (PA): conhecendo o território para conceber uma educação integral

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Benevides (PA): conhecendo o território para conceber uma educação integral

Em novo projeto de assessoria, Cenpec conversa com escolas do município de Benevides, no Pará, para pensar junto uma concepção de educação integral para o território; saiba mais

Por Stephanie Kim Abe

Em uma roda de conversa, estudantes de anos iniciais do ensino fundamental da rede municipal de Benevides (PA) foram provocadas(os) a desenharem, a partir de suas memórias, um lugar de que gostassem muito na sua cidade. 

Realizada em agosto, essa roda de conversa aconteceu em uma visita ao município com o intuito de conhecer o território. Essa foi uma das primeiras ações da nova assessoria do Cenpec com a Secretaria de Educação do município paraense. O projeto, que tem como parceira financiadora a Associação Bem Comum, realiza assessoria à Secretaria de Educação para construção da Proposta Pedagógica da educação integral dos anos iniciais do ensino fundamental. Para isso, busca orientar pedagogicamente as equipes escolares para a implementação de um programa piloto em seis escolas municipais.

Nas produções abaixo, é possível identificar lugares como a casa e a escola. Mas o que mais chamou a atenção da consultora Mônica Cardim e do gestor Juvenal Coelho Soares da Fonseca foi a recorrência dos igarapés entre os desenhos.

Desenho de igarapé feito por uma estudante.

💧 De origem tupi, igarapé significa “caminho de canoa”(ygara, ou canoa + apé, caminho), e designa os pequenos cursos d’água que brotam pelo lençol freático na região da bacia amazônica. 

Mônica explica:

Foi muito interessante ver como a experiência com a água é muito importante para essas(es) estudantes. Benevides é um município pequeno da região metropolitana de Belém, com áreas urbanas centrais e um entorno de agricultura e áreas com igarapés”. 

Um igarapé específico foi recomendado pelas(os) estudantes para que a dupla de formadoras(es) conhecesse: o da casa da professora. 

Foto: acervo pessoal

Era a ‘piscina’ da professora. Todas as crianças conheciam a casa dela e davam detalhes do lugar: como é o igarapé, as árvores que ali existem e em quais elas brincam. Elas contaram que a professora dá sorvete de graça, e a professora explicou que o marido tem uma barraca de sorvete artesanal no centro”, conta. 

Mônica Cardim, consultora


Aproximação com o território

Mônica Cardim é consultora especialista em educação integral e Juvenal Coelho é gestor de implementação. Ambos fazem parte da equipe do Cenpec que está assessorando a Secretaria Municipal de Educação de Benevides (PA) na elaboração de sua concepção de educação integral para os anos iniciais do ensino fundamental. 

Desenho de igarapé feito por um estudante.

Pensar a educação integral é lidar com todos os aspectos do que é ser humano e do seu desenvolvimento pleno. Para fazer isso, nada melhor do que partir das crianças e então conhecer o espaço, conhecer as pessoas, conhecer as comunidades locais. O que percebemos foi uma relação muito afetiva, de maneira geral, entre as professoras e também gestoras e estudantes.”

Mônica Cardim, consultora

Juvenal Coelho, que nunca estivera antes no Pará, conta que foi importantíssimo ter esse contato com a região e, principalmente, com as pessoas:

Foto: acervo pessoal

No diálogo com as gestoras, professoras e estudantes, pudemos perceber e compreender o olhar que elas(es) têm para a educação, para a escola, para o território, para o que entendem por educação integral. Cada uma(m) trazia os seus anseios, como olhavam para suas(seus) alunas(os), como enfrentavam as dificuldades e também compartilhavam as alegrias”. 

Juvenal Coelho, gestor

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Uma educação integral concebida em conjunto

As gestoras Rosângela Nóbrega Pinheiro, da Escola Municipal de Ensino Infantil e Ensino Fundamental (EMEIF) Angélica Sales, e Conceição Alves Pereira, da EMEIF Deputado Gerson Peres, conversaram com a equipe do Cenpec e trouxeram reflexões sobre os benefícios de uma educação integral para suas escolas e estudantes. 

Elas pontuaram a importância de estender o tempo na escola, principalmente no caso das crianças de famílias mais vulneráveis, e de ofertar atividades que vão além do currículo tradicional trabalhado no tempo regular.

Foto: acervo pessoal

Atendemos estudantes de uma comunidade de baixa renda, então seria ótimo ter o tempo integral, pois as crianças sairiam das ruas para poder trabalhar atividades extracurriculares e outras habilidades. Para isso, precisaríamos ter algumas mudanças estruturais na escola, pois só temos duas salas hoje. Também tem a questão alimentar, pois as crianças poderiam ter mais refeições na escola”, pontua. 

Conceição Alves Pereira, da EMEIF Deputado Gerson Peres

Os estudantes gostam muito da parte artística, cultural e esportiva. Danças, músicas, aprender diferentes instrumentos são atividades que elas(es) gostam muito quando acontecem. Então acho que seriam outras tarefas além daquelas que elas(es) realizam no período de aulas normal, além de um reforço escolar”, diz.

Rosângela Nóbrega Pinheiro, da Escola Municipal de Ensino Infantil e Ensino Fundamental (EMEIF) Angélica Sales

Para continuar as conversas com representantes de polos das escolas e de núcleos da Secretaria, foi construído um grupo de trabalho, que deve participar de seis oficinas até dezembro. Nelas, diferentes temas estão sendo trabalhados, como alfabetização, concepção de tempo integral, e as diferentes áreas do conhecimento. 

“Em cada oficina estamos ouvindo as equipes e, de tempos em tempos, vamos ao território validar as escritas com esse grupo, construindo a quatro mãos esse trabalho”, explica Juvenal. 

Mônica acredita que o diálogo com o território tem servido para garantir que o projeto e a concepção de educação integral pensada não sejam externos e não estejam desconectados das necessidades de Benevides:

Nosso movimento, desde o princípio, é escutar o melhor que pudermos essas pessoas, para que a escrita do projeto de educação integral não seja feita por nós, mas conosco. Somos facilitadores desse processo. Gostamos muito de ouvir das pessoas que elas querem que o projeto tenha ‘a cara de Benevides’, e é isso que buscamos. Toda coletividade só se faz de individualidades, e essa noção de identidade de cada território é importante para constituir o Brasil”.

Mônica Cardim, consultora

Saiba mais sobre o que esperar do Programa Escola em Tempo Integral do governo federal


Pilares da educação integral segundo o Cenpec

Ao longo dos seus 30 anos de atuação, o Cenpec tem firmado uma trajetória de atuação contundente em projetos de educação integral, sempre com base em princípios que:

➕ Consideram o sujeito em sua integralidade, contemplando o desenvolvimento de competências e habilidades importantes para a sua formação integral e cidadã;

➕ Não só ampliam o tempo escolar, mas também os espaços educativos, os conteúdos do currículo e situações de aprendizagem;

➕ Consideram e incorporam os saberes das(os) estudantes e da comunidade de que fazem parte, assim como as especificidades de cada território; 

➕ Entendem a importância da formação continuada sistêmica para toda a rede de ensino, contemplando a construção coletiva das mudanças a serem realizadas na rede;

➕ Não apostam em um modelo único de educação integral;

➕ Objetivam a universalização da educação integral a todas as escolas da rede, não criando “ilhas de excelência” e não reforçando as desigualdades.

Veja como articular os pilares da educação integral


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