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As linguagens da criança e o mundo letrado
O papel das brincadeiras na exploração das linguagens e no desenvolvimento integral das crianças na educação infantil
- Tamara Castro
A brincadeira é a linguagem da criança, é o modo como ela se expressa, compreende a natureza, o mundo social e a si mesma. É também sua forma de interagir com os outros. Brincar é de fundamental importância para favorecer desenvolvimento integral da criança.
Ao tratar do desenvolvimento de 0 a 5 anos, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) da educação infantil afirma que:
“as aprendizagens e o desenvolvimento das crianças têm como eixos estruturantes as interações e a brincadeira”, buscando assegurar os direitos de conviver, brincar, participar, explorar, expressar-se e conhecer-se.
Assim, a estrutura curricular da educação infantil está organizada em cinco campos de experiências:
• O eu, o outro e o nós;
• Corpo, gestos e movimentos;
• Traços, sons, cores e formas;
• Escuta, fala, pensamento e imaginação;
• Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações.
Fonte: MEC/BNCC
Nesse sentido, é necessário planejar situações em que as crianças vivenciem as diversas linguagens: plástica, corporal, musical e verbal. As práticas de leitura, escrita e oralidade se incluem entre essas formas de expressão e devem ser oferecidas considerando as necessidades, os interesses e a importância do brincar nessa etapa do desenvolvimento.
Jogos e brincadeiras com palavras fazem parte da cultura de diferentes povos. Elas são maneiras de se envolver e forma lúdica com a linguagem verbal. Adivinhas, palavras cruzadas, forca, trava-línguas, parlendas, brincos, rimas, aliterações… São diversas as formas de manipular e se apropriar de palavras, compondo e decompondo-as.
Jogos de palavras convidam crianças a pensar sobre a dimensão sonora das palavras. Ainda bebês, já somos imersos no caldo da cultura, por meio da oralidade. Canções de ninar, cantigas de roda, lenga-lengas constituem logo cedo o mundo infantil.
O papel dos adultos, sejam os pais, avós, sejam cuidadores, educadores é fundamental nesse processo, fazendo a mediação necessária para entenderem como se dão as relações humanas e a exploração das linguagens. As brincadeiras mediadas e espontâneas serão base para a alfabetização posterior dessas crianças.
Na educação infantil, o objetivo não é a alfabetização precoce, lembra a especialista em alfabetização Maria Alice Junqueira. Nesse momento, diz a educadora, o importante é que a família e a escola deem às crianças a oportunidade de entrar em contato com o mundo das palavras, orais e escritas, de forma livre, explorando não só as dimensões lúdica e estética da linguagem verbal, como também sonora e gráfica.
Alice ressalta que o trabalho com a cultura escrita na educação infantil deve ser sempre articulado às outras linguagens e às brincadeiras. Mas que tipo de brincadeiras podem favorecer o desenvolvimento da linguagem verbal?
Para a educadora e psicóloga, que coordena o projeto Letra Viva Alfabetiza (CENPEC), voltado à formação de alfabetizadores, as brincadeiras com palavras, de faz-de-conta, de ler e de escrever possibilitam o desenvolvimento verbal da criança.
No faz de conta, por exemplo, as crianças experimentam diferentes papéis, reais ou imaginários. Assim, elas procuram entender como funcionam as normas que organizam a sociedade.
Ao brincar de escolinha, as crianças se colocam no papel da professora e assumem o modo de falar que entende ser próprio desse lugar.
Brincando de loja, elas incorporam expressões típicas dessa função. Nessas brincadeiras simbólicas, as crianças pensam sobre o mundo, as relações sociais e o papel da linguagem como mediadora dessas relações.”
Maria Alice Junqueira
“Entendemos os jogos e as brincadeiras como parte da cultura. É o adulto, seja a mãe, o pai, os avós, seja o cuidador, o educador quem apresenta brincadeiras tradicionais. Isso acontece desde bebês, por meio de acalantos e brincos, por exemplo”, lembra Alice.
Na escola, situações lúdicas podem acontecer tanto de forma espontânea, como propostos e mediados pelos professores. Criar cantos em que as crianças possam brincar de faz-de-conta, tendo à disposição fantasias, roupas, utensílios é uma forma de promover e estimular essas experiências.
Como brincadeiras da nossa cultura oral podem contribuir para a educação infantil?
Leia a matéria.
Mais próximas da alfabetização e do letramento, estão as brincadeiras de ler, que também podem ser ou não mediadas pelos adultos. A leitura em voz alta pelo professor ou por alguém da família é um bom exemplo de brincadeira de leitura mediada com o objetivo de aproximar as crianças do mundo letrado.
No Brasil, muitas famílias não têm a leitura como hábito nem livros disponíveis. Por isso, o papel da escola em promover o contato com a cultura letrada é fundamental.
Nesse sentido, é necessário organizar cantinhos de leitura, com materiais diversificados, selecionados de acordo com os interesses e o perfil das crianças, assim como momentos e situações diversas em que elas possam escolher, manipular os livros e brincar de ler, em grupos, duplas ou sozinhas.
Nas brincadeiras de ler as crianças têm à disposição livros, revistas, gibis e podem explorar livremente esses materiais, explorar as ilustrações, imaginar o que elas estão contando sobre aquela história, recontá-la do seu jeito para os colegas ou para si mesma… São essas diversas e ricas situações de contato com a leitura não podem faltar na escola, destaca a educadora.
A leitura em voz alta pelo professor também é um momento que deve ser planejado e acontecer todos os dias, ressalta Alice. Ao ler para a turma, o professor está aproximando as crianças do mundo letrado.
Como leitor mais experiente, o professor serve de modelo para as crianças se arriscarem em situações espontâneas com a leitura. Fazendo a ponte entre os leitores iniciantes e os livros, o professor pode observar com eles recursos estéticos, expressivos próprios da linguagem literária, as características dos gêneros textuais, os elementos que compõem um livro, como título, autor, ilustrações, sumário etc.
Magda Soares, professora emérita da Universidade Federal de Minas Gerais, também destaca a importância da leitura do professor como modelo para as crianças.
Não há nada que ajude tanto a criança na educação infantil como a leitura do texto acompanhada pelo dedo da professora. Assim a criança percebe que aquilo que a professora está lendo está representado por aquelas letras. E que a leitura vai da esquerda para a direita e de cima para baixo. Dessa forma, com 3 ou 4 anos, a criança está se letrando e ao mesmo tempo se alfabetizando.”
Magda Soares
Ao cantar e bater palmas em cantigas, quando brincam de trava-língua, adivinhas, trovas, o foco das crianças se volta para os sons das palavras. De forma espontânea, segmentam as palavras em sílabas, repetem as sílabas finais, inventam rimas e aliterações, transformando a palavra em brinquedo.
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Essas situações podem e devem acontecer de forma livre, dentro e fora da escola. Mas também podem ser exploradas na aprendizagem, quando o professor ajuda as crianças a observar características da linguagem e a sistematizar os conhecimentos adquiridos de forma lúdica.
Um bom exemplo é o jogo “Palavra dentro de palavra“. Pode ser muito divertido às crianças descobrir que, no mundo mágico das palavras, o “pato” mora dentro do “sapato”, o “repolho” tem um “olho” e que “soldado” é a união entre “sol” e “dado”. Assim, o foco recai sobre os sons que compõem as palavras.
Dessa forma divertida e dinâmica, o professor, já na educação infantil, cria situações favoráveis para que os pequenos desenvolvam a consciência fonológica, ou seja, percebam que a escrita é uma representação dos sons da fala. Essa é uma descoberta essencial para a alfabetização, que será o objetivo do ciclo inicial da próxima etapa de escolarização, no ensino fundamental.
A escrita também pode ser uma brincadeira para as crianças imersas desde cedo no mundo letrado. Por exemplo, elas podem brincar que estão escrevendo uma receita médica, usando desenhos ou garatujas, imitações de escrita. Ou ainda, brincar que enviam mensagens no celular ou no computador. São inúmeras as situações que possibilitam aos pequenos refletir sobre a língua escrita e fazer hipóteses e descobertas importantes.
É importante que a brincadeira, linguagem natural da criança, não se torne apenas pretexto para a aprendizagem da língua escrita, mas que seja um contexto em que o letramento se desenvolva, ao lado de outras práticas sociais associadas à escrita, como leitura de livros, registro de histórias, coletânea de brincadeiras, confecção de coletânea de adivinhas, pesquisa de brincadeiras presentes na memória das famílias, entre outras possibilidades.
Como lembra Alice Junqueira, na educação infantil o objetivo é dar oportunidade para explorar todas as linguagens, de forma articulada, espontânea e lúdica, a fim de promover o desenvolvimento integral das crianças.
a brincadeira é de fundamental importância e constitui-se como uma das principais atividades promotoras da aprendizagem e do desenvolvimento infantil, pois, além de interagir com os outros e aprender regras de convívio social, quando brincam as crianças se comunicam, manipulam objetos, desenvolvem a atenção, a memória e a imaginação.”
Raimunda Alves Melo (UFPI)
Leia mais em Sequências lúdicas de aprendizagem: uma proposta do Palavra de Criança
Entrevista com Madga Soares: Como mediar a aprendizagem da língua escrita?
Pé de palavra: RAP, rima, trava-língua. Ouça a entrevista com o educador e músico P.MC
O rapto da vaca sagrada (CENPEC): conheça o e-book e app voltado a crianças em alfabetização
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