Entrevista com o escritor Cacá Lopes. Texto publicado originalmente em 2013 pela Plataforma do Letramento
Cantor, compositor, violonista, cordelista e educador social. Essas são as atribuições de Cacá Lopes, pernambucano do município de Araripina. O artista destaca-se pelo uso do cordel e da música popular nas escolas e em espaços públicos.
Nesta entrevista, Cacá fala sobre sua formação, suas influências e sobre este gênero literário que faz parte da identidade cultural brasileira: o cordel.
Portal CENPEC: O cordel é um gênero literário que retrata a cultura popular brasileira. Como foi o seu primeiro contato com o cordel? Cacá Lopes: O encanto do cordel chegou até a minha alma por meio do meu pai, Elpidio Lopes Frazão, que na época sempre trazia em seu matulão [saco onde se carregam pertences] de feira alguns folhetos, também chamados de romances ou versos. Ao retornar de Araripina para o nosso sítio, Lagoa da Onça, ele lia para seus seis filhos, no avarandado da nossa casa, muitos cordéis, que com o passar do tempo tornaram-se muito populares.
Luiz Gonzaga, 1957. Fonte: Wilipédia
Portal CENPEC: Em seu site, você homenageia Luiz Gonzaga, figura inesquecível da música popular brasileira. Mas, além de ouvir a boa música do Gonzagão, você certamente lia cordéis quando criança. Há algum, em particular, de que você se recorda? Se sim, poderia reproduzi-lo?
Cacá Lopes: Na música, Luiz Gonzaga sempre foi uma grande referência. Cresci ouvindo suas canções. No ano do centenário de nascimento de Gonzaga [em 2012], prestei também minha homenagem a esse mestre de Exu [município pernambucano], com o lançamento do livro Vida e obra de Gonzagão em cordel, pela editora Ensinamento.
Capa do livro
Ainda sobre o cordel, ao remexer nos guardados da minha infância, as lembranças que me chegam são de três títulos que se tornaram clássicos da lira popular. São eles: A chegada de Lampião no inferno, de José Pacheco; A história de Mariquinha e José de Souza Leão, de João Ferreira Lima; e a Peleja do cego Aderaldo com Zé Pretinho do Tucum, de Firmino Teixeira do Amaral. Eu lia esses e outros títulos adquiridos nas feiras do sertão; alguns versos ficaram grudados na minha mente até hoje. Eis uma estrofe da chegada de Lampião no Inferno:
Um cabra de Lampião Por nome Pilão Deitado, Que morreu numa trincheira Em certo tempo passado, Agora pelo sertão Anda correndo visão Fazendo mal-assombrado.
Portal CENPEC:As histórias dos cordéis e os causos do interior de São Paulo têm aspectos em comum? O que aproxima ambos?
Cacá Lopes: O cordel é uma história rimada. É o romanceiro do povo do sertão. Os causos da roça também têm essa característica. Na minha opinião, eles têm muita coisa em comum, e o que aproxima os dois é a maneira como são apresentados, geralmente em alpendres, varandas, ruas e praças, sem falar da riqueza e da simplicidade de seus personagens.
J. Borges/Divulgação
Portal CENPEC:Na sua obra, você utiliza trava-línguas e ditados populares. Por qual motivo decidiu agregá-las? E o público, como reage a essas justaposições?
Cacá Lopes: Aprendi meu primeiro trava-língua aos sete ou oito anos de idade. Gostei da brincadeira. Em relação aos ditados populares, tenho grande paixão e até me tornei colecionador. Tenho catalogado, em ordem alfabética, cerca de 10 mil trava-línguas, que, aos poucos, vou publicando e divulgando no meu projeto Cordel nas escolas. Nas minhas apresentações, em pátios e bibliotecas, percebo a facilidade de interagir com as crianças e os adolescentes. Trava-língua é uma brincadeira divertida, assim como o próprio universo infantil, por isso tem tanta aceitação.
Portal CENPEC:Como é o seu processo criativo na elaboração dos versos de cordel?
Cacá Lopes: Primeiro, eu escolho um tema; depois, elaboro o conteúdo. Devido à riqueza das rimas, alguns cordéis se tornam canções. Além de mim, outros poetas cordelistas utilizam a música em suas apresentações.
Portal CENPEC:O público adulto se interessa por cordel?
Cacá Lopes: O cordel é abrangente; comunica-se com diversos públicos. Os adultos também gostam desta fantástica manifestação cultural, talvez porque o cordel tem um pé no interior, no sertão, e, por meio dessas histórias, leva as pessoas adultas a uma viagem às suas origens.
Portal CENPEC: Elaborar um cordel é simples?
Cacá Lopes: Rimar é fácil; porém fazer um cordel completo é muito trabalhoso. É preciso muito cuidado com o tratamento dado à poesia popular. Observo, na internet, muitos textos desmetrificados e sem nexo. Há muita confusão no que se refere ao cordel e à poesia matuta.
Cacá Lopes. Reprodução
Portal CENPEC: O que você diria para nossos leitores sobre a leitura de cordel?
Cacá Lopes: Que continuem lendo cordel, se possível em voz alta. Leiam um título mais de uma vez, sozinhos ou em grupo. O cordel chegou às escolas e vive um ótimo momento. A prova disso é a quantidade de obras lançadas: são releituras fantásticas da literatura brasileira e universal em forma de livros ilustrados, adaptados por alguns dos maiores nomes da poesia popular da atualidade. Essas obras ganham novo formato, despertando no leitor a vontade de conhecer ou reler o original. Ler é viajar sem sair do lugar. Boa viagem!
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